Quarenta anos depois
O regresso
As quarenta e oito horas mais longas, precederam a manhã em
que um voo de cerca de oito horas me levaria ao concretizar do “sonho”.
A ansiedade aumentava a cada minuto contado após a
descolagem no Aeroporto Sá Carneiro no Porto.
Recostada no assento e embalada no som dos motores do avião,
só as nuvens me iam dizendo que o meu tempo já era tão meu, e do tamanho do
sonho que nunca abandonei: Regressar à terra que me viu crescer, Luanda.
Era jovem, sonhadora, teimosa, rebelde e irreverente, quando
um dia me disseram que tinha que partir, que esta terra não podia ser mais o
meu “ninho”.
Irreverente sim. Teimosa a ponto de nunca ter desistido de
regressar, e de passados quarenta anos, já a caminho de ter neve nos
cabelos…Voltar.
Fechei os olhos, e deixei que mil borboletas me invadissem a
barriga. Aquela bendita voz, anunciava que dentro de uma hora aterraria no
aeroporto de Luanda.
Endireitei o assento, coloquei o cinto de segurança…Era
chegado o “momento”.
Colei o nariz ao pequeno vidro que me separava do céu, e
logo o que me pareceu uma miragem, de repente era uma certeza absoluta: Luanda,
estava ali, a meus pés.
Quase me saltou o coração quando vislumbrei a “iIha”, a baía
e pequenos barquinhos navegando em direção ao porto.
Um sobressalto de
pneus que rasgavam o solo ao som de reatores em retrocesso.
E a terra…A Terra vermelha ali estava. A tal terra que me
levou aos tempos de menina.
A tal terra que soltava aromas mágicos quando a chuva bebia,
e a emprenhava enquanto lhe matava a sede.
Foram lágrimas que lavaram o sorriso, foram sensações
indescritíveis. Foram momentos que só quem ama muito sabe como é “matar a
saudade”.
Já em “terra firme”, bebi os cheiros, senti o mesmo calor.
Aquele que sempre recordei durante quarenta anos.
Embebedei os olhos sorvendo cada pedaço de estrada, mesmo
cada buraco traiçoeiro.
E viajei.
Viajei aos tempos de menina e moça, à escola da Cuca, ao
Liceu Feminino, aos passeios pela marginal, à praia da Ilha, à rebeldia dos
meus dezasseis anos.
E cá estou eu. Percorrendo as ruas da cidade que nunca
deixei de ter como “minha”, mesmo tendo já passado mais tempo lá do que cá. Mas
que nunca minha foi
Mesmo sentindo as diferenças, Luanda será sempre Luanda…A
Eterna.